Do Arataca ao Clube da Luta: o fim de uma era da música em Floripa

Com a demolição das “ruínas” do estaleiro Arataca, que ficava sob a Ponte Hercílio Luz, foi-se também os últimos vestígios dos tempos áureos da diversão e da música na cidade.

Durante as décadas de 1980, 1990 e 2000, o local abrigou casa de show, bar, café e casa de eventos, como o Arataca e Fios & Formas, por onde passaram muitas bandas e artistas locais e nacionais.

O coletivo de bandas Clube da Luta fez do Fios & Formas a sua casa e também a última ocupação cultural do espaço que fechou em 2008. – Foto: Cassiano Fagundes/Divulgação

Nas décadas de 1980 e 1990, o local viveu o seu auge com a operação do Bar Arataca, batizado com o nome do antigo estaleiro (1907 a 1964). O bar foi um dos centros de efervescência da juventude da época e proporcionou um espaço providencial para bandas novas, veteranas e músicos de Floripa e região. Até hoje é lembrado.

O Arataca fechou e nos anos 2000 o imóvel foi alugado e ali passou a operar o Espaço Fios & Formas, misto de salão de beleza, com café e casa de eventos. O salão na parte de cima recebia shows rotineiramente, até porque a capacidade para o público era generosa. Bandas como Immigrant, Dazaranha, Iriê, John Bala Jones, Tijuquera, Pipodélica, Los Hermanos, Clube da Luta e tantas outras fizeram apresentações memoráveis.

Com Los Hermanos, Pipodélica e Repolho: palco balança, mas não cai!

Entre as tantas ocasiões que marcaram, teve o show da banda Los Hermanos, com as catarinenses Pipodélica (Floripa) e Repolho (Chapecó), em 2004. Era um momento especial não só para a banda carioca, que ascendia como um foguete nacionalmente na esteira dos álbuns “Bloco do Eu Sozinho” (2001) e “Ventura” (2004), mas também para as catarinenses. Pipodélica, quarteto de Florianópolis, estava em evidência nacional por conta do lançamento do álbum “Simetria Radial” e estava também em excursão com Los Hermanos.

Há 10 anos, as bandas catarinenses Pipodélica e Repolho se reuniam em Floripa para dividir – e segurar – o palco do Fios & Forma com Los Hermanos (RJ). Um show memorável! – Foto: Eduardo Xuxu, Arquivo Pessoal/Divulgação

A irreverente Repolho, de Chapecó, era outra banda que trilhava seu caminho no então hypado cenário do rock independente nacional. Muita gente apareceu naquela noite para assistir as três bandas. Gente até demais. Digamos que o conceito de lotação máxima no espaço era um tanto oscilante (sempre para mais).

Eduardo Xuxu, guitarrista da Pipodélica, lembra que na ocasião o palco onde as bandas se apresentavam começou a ceder. Abaixo do palco ficava o “camarim” das bandas. Os Los Hermanos estavam tocando e chegaram a interromper a apresentação logo nas primeiras músicas para pedir ao público para se afastar e isolar a frente do palco.

Os integrantes da Pipodélica e Repolho estava no camarim e perceberam quando o teto começou a balançar. Foi então que Coube ao músico Demétrio Panarotto, da Repolho, incorporar a “estátua do Desbravador” de Chapecó para sustentar com as mãos parte do tablado que servia de teto enquanto a produção tentava escorar o palco emergencialmente.

Os cineastas e produtores Loli Menezes e Marko Martinz (do projeto “Kombinado”) estavam lá e registraram em vídeo a apresentação da Pipodélica – com Loli dividindo os microfones.


Show da banda Pipodélica, em 2004, no Espaço Fios & Formas (antigo Arataca). – Vídeo: Divulgação

Clube da Luta e o último suspiro do Arataca!

Em 2006, Floripa foi tomada de assalto por um movimento de bandas autorais do cenário independente da cidade chamado Clube da Luta. A bandeira era a valorização da produção autoral dos artistas locais e por parte de bares, casas de shows, rádios e veículos de mídia.

E foi no Fios & Formas que o coletivo encontrou abrigo, promovendo por quase dois anos ensaios abertos – que depois viraram shows – aos finais de semanas. Ali se estabeleceu uma conexão muito forte com um público que buscava novidades e novos sons.

Pelas sessões do Clube passaram grandes do Clube como Samambaia Sound Club, Coletivo Operante, Sociedade Soul, Maltines, Kratera, Da Caverna, Tijuquera (a única na ativa até hoje), entre outras.
O clima era muito astral. Você curtia os shows e contemplava o deslumbre do cenário com a cabeceira da Ponte Hercílio Luz acima. A despedida foi em 2008, com um festival de aniversário do Clube da Luta que durou dois dias. O próprio coletivo também tinha outros planos.

André Guesser, um dos coordenadores do clube e na época baterista da Samambaia Sound Club, lembra que “o fim do Fios & Formas marcou uma nova vida para o Clube da Luta”. “O Fios & Formas iria fechar para reformas, mas o Clube resolveu não esperar e então fomos buscar um espaço só nosso, dentro do nosso plano de fortalecer o coletivo como uma cooperativa. Dali fomos para o João Paulo, onde surgiu a Célula Cultural (hoje Célula Showcase), que segue até hoje aí como um legado desta cena”.

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