Pesquisadores da UFRRJ identificam peixe ameaçado de extinção em novos locais na Baía de Sepetiba

Pesquisadores do Laboratório de Ecologia de Peixes (LEP) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) identificaram uma rara espécie de peixe em novas localidades nas planícies costeiras da Baía de Sepetiba, na Zona Oeste do Rio de Janeiro. Batizada de Notholebias minimus, a espécie enfrenta um risco muito elevado de extinção na natureza. Popularmente conhecidos como “peixes das nuvens”, eles são coloridos e minúsculos, atingindo no máximo quatro centímetros de comprimento. Pertencem aos rivulídeos, um grupo diversificado com mais de 300 espécies no Brasil, das quais 130 estão ameaçadas, de acordo com a Lista Oficial das Espécies Ameaçadas de Extinção divulgada em 2022 pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) do Ministério do Meio Ambiente (MMA). Com isso, ocupam o primeiro lugar em número de espécies ameaçadas de toda a fauna brasileira.

A descoberta de três novos locais de ocorrência da espécie – dois no município de Seropédica, incluindo o registro inédito no campus da UFRRJ, e um novo registro na cidade do Rio de Janeiro, na Área de Proteção Ambiental (APA) das Brisas – é um dos resultados da pesquisa de doutorado do biólogo Gustavo Henrique Soares Guedes, desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Biologia Animal (PPGBA/UFRRJ), sob orientação do professor do Departamento de Biologia Animal (IB/UFRRJ) Francisco Gerson Araújo, coordenador do LEP/UFRRJ. A espécie Notholebias minimus é endêmica, quer dizer, pertence originalmente à Mata Atlântica, com distribuição também conhecida na Floresta Nacional Mário Xavier, Unidade de Conservação localizada no município fluminense de Seropédica.

A pesquisa foi desenvolvida com apoio da FAPERJ, por meio do programa Apoio a Projetos Temáticos no Estado do Rio de Janeiro, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (FUNBIO – Conservando o Futuro).  A descoberta resultou na publicação de artigo para a revista Neotropical Ichthyology e está disponível para leitura gratuita. Os novos dados de ocorrência do N. mininus também estão disponíveis no Sistema de Informação sobre a Biodiversidade Brasileira (SIBBr) e na Global Biodiversity Information Facility (GBIF), plataformas digitais que integram dados abertos sobre a biodiversidade e os ecossistemas.

Os desafios da preservação dos peixes anuais

Com um ciclo de vida peculiar, as principais ameaças aos rivulídeos são a perda e a degradação de seus habitats. “Os pântanos e brejos temporários onde esses peixes habitam vêm sendo drasticamente destruídos, devido ao desmatamento, drenagens e aterros resultantes da expansão agrícola, urbana e industrial”, explicou Gustavo. Ele contou que, durante o período chuvoso, brejos e pântanos estão cheios d’água e os peixes das nuvens estão no ambiente se alimentando e se reproduzindo. Dentro da reprodução, ocorre a deposição de ovos resistentes no solo. Quando as águas começam a baixar no período seco, todos esses peixes morrem, e seu ambiente, que antes era aquático, se transforma em um ambiente terrestre.

Trabalho de campo: o biólogo Gustavo Guedes durante expedição na Reserva Biológica de Guaratiba

Então, como os peixes conseguem superar essa oscilação hídrica tão marcante? “Através dos ovos que ficaram enterrados no substrato sob um complexo processo de diapausa embrionária. Os ovos desses peixes funcionam como ‘sementes’, esperando o próximo período chuvoso para eclodir e recolonizar os brejos, dando origem a uma nova população de peixes das nuvens, sem sobreposição de gerações. Ou seja, os pais não conhecem os filhos e vice-versa”, detalhou. O pesquisador complementou que o nome peixe das nuvens, pelo qual as espécies são conhecidas, surgiu dessa dinâmica surpreendente: “Antes, acreditava-se que os peixes caiam do céu junto às chuvas. Mas, como antes dito, eles nascem é da terra.”

Daí a importância de se conhecer quais são os locais que abrigam os peixes e seus ovos, para que tais localidades possam ser protegidas de intervenções humanas, com a promoção de medidas que visem a conservação da espécie. Nesse sentido, a pesquisa do LEP/UFRRJ enfatiza a importância das áreas protegidas. “Nosso estudo indica que os habitats de N. minimus localizados dentro de unidades de conservação apresentam maior preservação e tendências de restauração ambiental entre 1985 e 2021. Por outro lado, locais sem nenhuma proteção apresentam maior cobertura de matrizes antrópicas, como pastagem e área urbana, e perda de áreas úmidas temporárias no mesmo intervalo de tempo”, detalhou.

Um longo caminho até o registro inédito

O Laboratório de Ecologia de Peixes (LEP/UFRRJ) tem uma equipe de biólogos que trabalha no projeto de monitoramento de rivulídeos coordenado pelo professor Francisco Gerson Araújo. É neste projeto que se insere a pesquisa de doutorado de Gustavo, que realizou amostragens de peixes entre os meses de fevereiro e dezembro de 2022 em cinco localidades nos municípios de Seropédica e do Rio de Janeiro: APA das Brisas, campus Seropédica da UFRRJ, Chaperó, Parque Natural Municipal Bosque da Barra e Reserva Biológica Estadual de Guaratiba.

Das novas localidades de ocorrência de Notholebias minimus, dois registros ocorreram em Seropédica e o outro foi feito no município do Rio de Janeiro, na APA das Brisas. Em poças temporárias, nesses locais, os pesquisadores identificaram um total de 156 indivíduos de N. minimus. De acordo com Gustavo Guedes, os novos registros sugerem que a espécie está em posição de conservação mais favorável quando comparada a outras do gênero Notholebias.

Diante da identificação da espécie em novos locais, os pesquisadores sustentam que é necessário manter um monitoramento contínuo para garantir a preservação desses peixes ameaçados. Após a identificação do N. minimus, a equipe do LEP/UFRRJ prossegue em busca de outras espécies de peixes das nuvens ameaçadas de extinção no estado do Rio de Janeiro, algumas destas consideradas possivelmente extintas na natureza. O registro do Notholebias minimus se une ao de uma outra espécie de peixe das nuvens, o Leptopanchax opalescens, localizado em 2018 pela equipe ruralina.

 

Fonte: FAPERJ

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