
O cidadão entra em sua seção eleitoral, pega o título de eleitor – um documento com foto onde está registrada até sua profissão – e entrega a um dos seis mesários convocados.
Uma vez comprovada sua identidade, recebe duas cédulas eleitorais, uma para votar nos cargos majoritários e outra para os proporcionais. Depois de votar, deposita uma cédula em cada urna.

Cédula das eleições majoritárias de 1994 – Foto: Acervo Centro de Memória Desembargador Adão Bernardes/TRE-SC
Encerrada a votação, as urnas são recolhidas e levadas para um ginásio de esportes da cidade, onde diversas equipes de escrutinadores, cercados por fiscais de cada partido, têm a missão de separar, contar as cédulas, abrir cada uma delas e começar a contagem.
Você acabou de conhecer por alto como era a votação e a apuração no tempo da cédula de papel e da urna de lona. Um processo demorado, que levava dias para ser concluído.

Urna de lona usada para armazenar os votos em cédula de papel – Foto: Acervo Centro de Memória Desembargador Adão Bernardes/TRE-SC
“Na eleição presidencial de 1989, a Bahia demorou 15 dias para concluir a apuração”, relembra o diretor geral do Tribunal Regional Eleitoral de Santa Catarina (TRE-SC), Gonsalo Agostini Ribeiro, um veterano da Justiça Eleitoral que pegou toda a transição da votação em papel para a urna eletrônica.

Cédula do primeiro turno da eleição presidencial de 1989 – Foto: Acervo Centro de Memória Desembargador Adão Bernardes/TRE-SC
“Eu entrei na Justiça Eleitoral em 8 de janeiro de 1990, mas já tinha atuado como mesário também”, conta.
“As pessoas dizem: eleição é difícil. A eleição é muito fácil hoje, porque difícil era a época que se tinha que trabalhar com uma figura que não existe mais, que é o escrutinador. Era quem contava a cédula. Então a logística que envolvia, o custo social de uma eleição era muito alto”, avalia.
Título eleitoral com foto
O trabalho enorme de mesários começava já na identificação do eleitor. Até o recadastramento promovido em 1986 pela Justiça Eleitoral, os títulos de eleitor eram grandes, com foto e diversas informações pessoais, inclusive profissão.
“Aquele antigo, com foto, fazia parte de um documento chamado de auto de qualificação eleitoral”, explica Gonsalo.

Título de eleitor com foto de 1956 – Foto: Acervo Centro de Memória Desembargador Adão Bernardes/TRE-SC
No local de votação, o mesário tinha uma contraprova daquilo: outra parte que também tinha foto e todas as eleições em que aquela pessoa já havia votado. O mesário assinava naquele documento dizendo que o eleitor havia comparecido no dia tal e votou – e fazia o mesmo no título da pessoa e carimbava. A outra parte era devolvida para a Justiça Eleitoral, que era a comprovação que ele votou.
“Quando houve o recadastramento nacional e que tornou todo o mundo na mesma base de dados, passou se a ter aquele título pequeno. Você pode ver no título do teu pai, da tua mãe, de todos que têm daquele e que tinha na época mais de 18, está lá: dia 18 de setembro de 1986. Porque foi quando migrou”, esclarece.

Título de eleitor com data do recadastramento de 1986 – Foto: Acervo Centro de Memória Desembargador Adão Bernardes/TRE-SC – Foto: Acervo Centro de Memória Desembargador Adão Bernardes/TRE-SC
E uma curiosidade: alguns cartórios eleitorais mantiveram arquivados o título de eleitor antigo. Muitas pessoas depois foram atrás deste título porque ele registrava a profissão e aquilo serviu como comprovação para aposentadoria.
Para quem vai esse voto na cédula?
Depois desse protocolo de receber as cédulas e ser habilitado para votar em uma cabina, o leitor escrevia o nome do seu candidato.
“Então, imagine se o nome do candidato fosse Washington e a pessoa escrevia ‘Uoxito’. Valeu ou não valeu? Depende de quem vai ler o voto, que é o escrutinador. Então, era um negócio extremamente lento e interpretativo. O eleitor tinha certeza de que votou num determinado candidato, mas isso não quer dizer que vai se refletir no resultado, porque dependia de uma interpretação”, recorda.
Para Gonsalo, a chegada da urna eletrônica acabou com esse problema.
“Ela trouxe a igualdade do meu 8 com o teu 8, do meu 5 com o teu 5, porque ninguém está lendo o meu voto. Eu digitei essa informação. E não tem interpretação, porque tanto faz o teu grau de instrução quanto o meu, nós vamos ter a mesma grafia.”
Outra situação resolvida pela urna foi a questão dos votos em branco e nulos.
“Isso, no início, principalmente, fez com que caísse muito o número de votos nulos, porque o nulo na urna eletrônica tinha que ser algo forçado. Ou seja, você tem que votar, digitar um candidato que não existe, ou então o voto vai cair para um candidato”, lembra o diretor.
No caso dos votos em branco, a urna eletrônica trouxe outra vantagem: o fim da possibilidade de fraudes.
“Você teria que teclar na opção branco, não é? E quando era na urna de lona, você tinha que depositar a cédula sem nenhum registro. Mas aquela cédula sem nenhum registro, alguém de má fé poderia preencher na hora de apurar. Enfim, é um fato que ocorria”, ressalta.
Dias e dias de espera x rito sumário
Esse processo todo de apuração, com todas as suas etapas, durava dias.
“Demorava se de três a cinco dias para terminar uma eleição. Você começava na segunda-feira de manhã, 8 horas em alguns casos, e ia até sexta. Tinha estado que demorava dez dias. Hoje nós damos o resultado em três horas. E ainda tem gente que acha que está demorado”, afirma Gonsalo.

Boletim de urna encerra em segundos o que levava horas para ser feito com votação em papel – Foto: Ascom/TSE
Outro ponto que a apuração eletrônica proporciona é a volta rápida à vida normal.
“Nós, no dia seguinte, na segunda-feira, vida que segue, tudo está funcionando normal”, diz.
Segundo o diretor, todo o processo antigo muito desgastante, em especial para a sociedade, porque normalmente os escrutinadores também eram convocados como mesários.
“E aí a gente ia descobrir que ele era o caixa do Besc, que ele era uma pessoa do Banco do Brasil, que ele era um cara que trabalhava no escritório de contabilidade. A cidade ou aquela comunidade ia ficar parada por um tempo porque aquelas pessoas estavam num ginásio de esportes contando votos.”
Além disso, a pessoa convocada ainda tinha direito a dois dias de folga para cada dia trabalhado. “Havia um custo social muito elevado”, revela.
Além do “custo social” ainda há um custo financeiro a ser considerado. Atualmente, Santa Catarina convoca cerca de 70 mil pessoas para o trabalho nas eleições – isso com quatro mesários. Se fossem seis, como antigamente, o número chegaria a 105 mil.
“Sem contar aquelas pessoas que deveriam ir ainda ao ginásio de esporte para contar as cédulas”, destaca Gonsalo.
“Nós mudamos o conceito. Porque a informatização, seja no cadastro eleitoral, seja no processo de captação do voto, criou uma agilidade em todos os procedimentos eleitorais, em todo o trabalho eleitoral”, completa.
“A eleição hoje é uma moleza. Eu vou dormir em casa quando termina. Até 1995, quando tinha eleições aqui, a gente saía de casa e já sabia que ia dormir dentro de um ginásio de esportes. Nós tínhamos colchão para levar para os locais de apuração”, lembra o diretor.
“Era uma eleição onde não só os servidores, mas como juízes e promotores, tinham que ter uma atuação durante a noite inteira andando naquelas Veraneio da polícia pra eliminar a boca de urna, derrame de santinho, compra de voto, bloqueio de estrada, destruição do local de votação”, conta.
Evento da comunidade
Até meados da década de 1990, era comum instituir-se lei seca durante o período de votação. Segundo Gonsalo, houve época em que até bailes eram vetados nestes períodos.
“Era proibido um monte de coisas. Mudou também, então, hoje a eleição, ela é um evento da comunidade.”
O papel da Justiça Eleitoral
Com a experiência de 34 anos neste trabalho, o diretor geral do TRE-SC não tem dúvidas sobre o papel que a Justiça Eleitoral desempenha em todo esse processo.
“Na minha avaliação, e é o meu entendimento, é pegar o voto e devolver o resultado. Ponto. E o que importa para o eleitor é ele entender que voto não tem idade, todo voto conta, não tem religião, não tem cor. E querendo ele ou não, alguém vai ser eleito”, declara.
Por fim, Gonsalo Agostini Ribeiro estimula que o eleitor faça bem sua parte.
“A grande vantagem que ele tem é que é uma oportunidade muito grande de auxiliar na escolha de alguém que se sentará na cadeira de prefeito ou vereador por quatro anos, ele querendo ou não, com a ajuda dele ou não. Então, se ele pode contribuir, que conheça a história dos candidatos, entenda qual é a conduta dele, enfim, para fazer uma boa escolha”, finaliza.