Pesquisador da UFSC faz primeiro registro de espécie rara de louva-deus no Sul do país

Louva-deus da espécie Vates phoenix. Foto: Leo Lanna/Projeto Mantis/Divulgação.

O pesquisador Gabriel de Almeida Ponte Gomes, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), fez o primeiro registro do Sul do Brasil de uma espécie rara de louva-deus, com cerca de sete centímetros de comprimento, listras pelo corpo, formato de folha nas pernas traseiras e um pequeno chifre na cabeça: a Vates phoenix. A expedição noturna ocorreu em novembro de 2022 em uma mata próxima à Lagoa do Peri, no Sul de Florianópolis.

Gabriel, que é estudante da graduação em Ciências Biológicas na UFSC, estava acompanhado do colega Djonatan Artur Rosemann – também pesquisador –, que olhou para cima e observou um inseto grande camuflado nas árvores. Gabriel coletou o louva-deus e identificou que era do gênero Vates. “Eu sabia que era um gênero que ainda não tinha registro na Ilha, então seria um registro novo”, relatou. Mais tarde, quando identificou a espécie do animal, Gabriel descobriu que esta ainda não havia sido registrada em nenhum estado do Sul do país.

Além disso, a Vates phoenix só havia sido descrita antes pela observação de animais que estavam no Museu Nacional do Rio de Janeiro ou que caíram em armadilhas luminosas, com exceção de uma fêmea coletada no Jardim Botânico de Florianópolis. Então, além de ter feito o primeiro registro no Sul, o pesquisador também foi o primeiro a observar um macho da espécie na natureza.

Após a expedição, o indivíduo foi levado para o Laboratório de Sistemática de Diptera (LSDip/UFSC), onde foi alimentado, observado e criado durante 26 dias, até sua morte natural. Este louva-deus já era um adulto, mas a espécie pode chegar a um ano e meio de vida. A observação e pesquisa resultaram na publicação do artigo científico Novos Registros de Distribuição e Dados de História Natural de Vates phoenix Rivera et al., 2020 (Mantodea: Mantidae), em outubro deste ano.

Espécie se camufla entre folhas no estande do Laboratório de Sistemática de Diptera na 21ª Sepex da UFSC. Foto: Raissa Hübner.

Para verificar os registros desta espécie, o cientista utilizou o aplicativo iNaturalist, um software de ciência cidadã que permite fotografar plantas, animais ou fungos e publicar na plataforma para que outros usuários vejam as imagens e façam sugestões sobre a possível espécie fotografada. O iNaturalist usa a plataforma Google Maps, para que os usuários possam ver onde as observações foram feitas e clicar em pontos para visualizar o conteúdo compartilhado por outros observadores da região.

Gabriel checou o banco de dados do aplicativo e conseguiu perceber que o inseto capturado por ele era um Vates phoenix por conta de uma característica marcante: um lóbulo em sua perna traseira. “Esta espécie é muito fácil de ser identificada, ela tem uma ‘folhinha’ na perna muito maior do que qualquer louva-deus deste grupo”, explica.

Além disso, o gênero Vates possui uma característica que os diferencia dos outros louva-deus: um chifre reduzido na região da cabeça, que se assemelha a uma coroa. A hipótese é de que o pequeno chifre sirva para camuflagem, pois aparenta ser a ponta de um galho e torna o animal quase invisível nas florestas.

Espécie nativa da Mata Atlântica

A Vates phoenix é uma espécie nativa e endêmica da Mata Atlântica, ou seja, ela só existe nesta região geográfica. Os registros feitos por outros usuários no aplicativo também indicaram uma distribuição da espécie fortemente limitada pela floresta. “Com os dados do iNaturalist, a gente vê que o animal praticamente desenha a Mata Atlântica”, comenta Gabriel.

O pesquisador encontrou o louva-deus no Monumento Natural Municipal (Mona) da Lagoa do Peri, uma unidade de conservação municipal em Florianópolis, que é justamente uma área de Mata Atlântica, e explica que é comum que os animais se desloquem e se distribuam ao longo do bioma. “O bicho é quase um símbolo da Mata Atlântica, ele depende dela para sobreviver”, diz.

Gabriel Gomes é pesquisador do Laboratório de Sistemática de Diptera da UFSC. Foto: Gabriel Gomes/Divulgação.

Após a pesquisa, Gabriel concluiu que fazia sentido o animal ser encontrado na região Sul e questionou o motivo do primeiro registro da espécie ter sido o dele. “A espécie sempre esteve aqui na região, o problema é que não tem pesquisadores de louva-deus no Sul”, conclui, “dá para contar nos dedos quantas pessoas no Brasil estão fazendo pesquisa com louva-deus.”

O cientista explica que os louva-deus podem ser definidos como “grupo fantasma”, pois não possuem veneno nem qualquer substância química conhecida que possa ser usada em benefício dos seres humanos. Por isso, estes animais não recebem a devida atenção na pesquisa, explica. Além disso, se o inseto for colocado em alguma plantação para controlar uma praga, pode ser que se alimente de outros insetos além da praga.

A falta de estudos sobre o grupo faz com que não se saiba quais espécies podem estar ameaçadas de extinção pela perda de habitat. Por exemplo, algumas espécies podem ser muito específicas quanto ao tipo de vegetação ou clima que precisam para sobreviver. Se essas condições forem destruídas, essas espécies podem desaparecer antes que se possa identificar o problema.

Louva-deus são predadores de diversas espécies de animais, como moscas, mosquitos e baratas, e desempenham um papel importante no controle de outros insetos, ajudando a manter o equilíbrio nos ecossistemas onde vivem. O artigo publicado por Gabriel evidencia a importância da preservação da espécie e do incentivo à pesquisa destes animais.

A pesquisa completa está publicada no artigo científico e tem como autores o graduando Gabriel Gomes, o professor Luiz Carlos de Pinho, coordenador do LSDip, e Leonardo Lanna, diretor-fundador do Projeto Mantis, um projeto independente que realiza expedições em florestas tropicais com o objetivo de expandir os estudos com os louva-deus.

Raissa Hübner 
Estagiária de Jornalismo | Agência de Comunicação | UFSC
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