

Kelli é cabo da Polícia Militar de SC e tentou salvar o jovem Gabriel, porém foi atropelada; a policial atropelada tentou salvar a vítima – Foto: Arquivo Pessoal/ND
A policial militar Kelli Rodrigues da Silva seguia para o quartel quando foi abordada por duas mulheres em pânico. Um jovem estava caído na rua. Sem hesitar, ela se aproximou para prestar socorro. Mas, em questão de segundos, um feixe de luz rompeu a escuridão — um carro se aproximava rápido demais.
A policial atropelada tentou salvar a vida de Gabriel dos Santos, de 29 anos, porém o jovem não resistiu e morreu ao chegar no hospital. O caso aconteceu na noite de 5 de maio, em Curitibanos, no Meio-Oeste de Santa Catarina, e comoveu moradores e colegas da corporação, que exaltaram o ato de coragem da policial.
A cabo conversou com o repórter da NDTV RECORD, Luan Turcatti, e contou os detalhes do dia do atropelamento, sua recuperação após os graves ferimentos e as homenagens que recebeu pelo ato de bravura.
Ela relembrou a noite de 5 de maio, quando encontrou Gabriel com batimentos cardíacos frágeis e um trauma na cabeça, acompanhado de sangramento. “Fiz a ligação para a emergência e comecei os primeiros socorros, tentando estancar o sangue e iniciar as manobras de reanimação cardiorrespiratória”, explicou.
Enquanto tentava deslocar a vítima para o lado da pista, uma forte luz se aproximou rapidamente. “Só lembro de estar no colo do meu colega, que me contou que eu havia sofrido um acidente”, disse Kelli.
Com muita dor nos joelhos, ela descobriu que tinha uma fratura. Além disso, apresentava um corte profundo na cabeça e precisou passar por cirurgias nos dois joelhos. O impacto causou rompimento de ligamentos e outras fraturas.

Atropelamento aconteceu no começo deste mês; a policial atropelada tentou salvar a vida de Gabriel – Foto: Divulgação/Internet/ND
Kelli explica que tentou salvar a vida de Gabriel. “Eu não faria diferente, pois quando passamos no curso da PM, prometemos, mesmo com risco de vida, atuar nessas situações. Pensei que não viveria dessa forma aquele juramento que fiz”, relata.
Verdadeiro milagre
Ela tentou tirar a vítima do meio do asfalto, mas o carro atropelou os dois antes que conseguisse. “Me considero um milagre. Acredito que Deus tem um propósito muito grande para minha vida, e não era a hora de eu partir”, completou.
Agora, a policial atropelada está em recuperação e deve passar por fisioterapia. “Se Deus quiser, a recuperação deve levar cerca de oito meses, mas isso vai depender da minha evolução”, afirmou.
Kelli conta que está cercada por uma rede de amor e apoio da família, colegas e alunos. “Se não fosse por eles, não sei o que seria de mim”, destacou.
O que lhe dá forças é o apoio das pessoas que torcem por sua recuperação. “É por todas essas pessoas que vou lutar para ficar cada vez mais perto da minha reabilitação. Lembro de cada mensagem que recebi e quero estar sempre com esse pessoal, porque são eles que me movem”, finalizou.

Kelli é cabo da Polícia Militar de SC e tentou salvar o jovem Gabriel, porém foi atropelada – Foto: Arquivo Pessoal/ND
Homenagem Câmara de Vereadores
Kelli recebeu uma homenagem da Câmara de Vereadores de Curitibanos nesta semana. O vereador responsável pela proposição, Jair Arruda, explicou que a moção de congratulações foi uma forma de reconhecer o trabalho e a coragem da cabo.
Ele ressaltou que ações como a dela representam tudo o que a sociedade espera daqueles que trabalham na segurança pública, incluindo Polícia Militar, Corpo de Bombeiros e Samu. “A segurança pública não serve apenas para nos proteger de atos criminosos, mas também para prestar primeiros socorros e salvar vidas”, afirmou.
Além disso, o vereador lembrou que uma moção semelhante foi aprovada na Assembleia Legislativa. “Na próxima segunda-feira, a Câmara de Vereadores fará uma moção de apelo ao governador para que a promoção da cabo Kelli a sargento seja reconhecida como um ato de bravura”, anunciou.
‘Era minha esposa no chão’, diz bombeiro sobre atropelamento
Quem atendeu o chamado do atropelamento foi o próprio marido de Kelli, o sargento Adriano Roberto Kieski. Durante o chamado ele descobriu que uma das vítimas era sua esposa.
Em depoimento, o sargento Kieski contou como foi receber a chamada que mudou sua noite: “o primeiro chamado foi de um atropelamento. Era uma vítima só, sem carro no local, então nossa ambulância foi atender. Três minutos depois veio outro chamado de atropelamento. A solicitante era minha esposa. Ela estava no chão, pedindo socorro, depois de também ter sido atropelada.”

Policial atropelada foi atendida também pelo marido, que é bombeiro- Foto: Divulgação/ND
“Ela teve o instinto de salvar o rapaz. Quando viu que o carro viria contra ele, agarrou nele tentando tirar da frente, mas não conseguiu. Ambos foram atingidos”, disse o sargento.
Ao chegar ao local, Adriano conta que o choque foi imediato: “A gente, bombeiro, está acostumado a atender. Mas quando é da família, tudo muda. Vi o sangue, não sabia se era dela. Ela estava caída, sendo amparada pelos colegas. Muito sangue na cabeça, dor nas pernas, escoriações. Foi desesperador.”
Quanto ao processo de recuperação da policial atropelada, os desafios têm sido grandes e exigiram mudanças significativas na rotina da família. “A situação mudou da água para o vinho”, comentou o marido.
Para facilitar os cuidados, a família precisou se mudar da casa na cidade para uma residência no sítio, que é mais ampla, sem degraus, e conta com um banheiro espaçoso, ideal para que a policial atropelada possa tomar banho usando a cadeira de rodas.
Encontro da policial atropelada com a mãe de Gabriel
O reencontro entre dor e gratidão aconteceu no hospital, no mesmo dia do atropelamento que tirou a vida de Gabriel. Sandra de Almeida, mãe do jovem, fez questão de conhecer a policial atropelada.
“Eu fui agradecer. Conhecer a pessoa que tinha feito de tudo, arriscado a vida para salvar o meu filho”, contou Sandra. O momento foi marcado por forte emoção. “Ela também estava passando por um momento de bastante dor. Estava sendo medicada, fazendo curativos, estava bastante inchada. Era uma dor para ela, uma dor para mim, pela perda do meu filho.”

Mãe do Gabriel, jovem que morreu no acidente, agradeceu a PM Kelli pela atitude; policial atropelada tentou salvar o filho de Sandra – Foto: Balanço Geral/ND
Com voz embargada, Sandra disse que acredita que a policial atropelada fez tudo o que podia. “Ela tentou, mas provavelmente era a hora dele. Ele já estava com os batimentos bem fracos. Ela ia iniciar a reanimação enquanto aguardava o Samu. Eu só peço muito a Deus que ela se recupere o quanto antes”, completa.

A policial atropelada tentou salvar a vida de Gabriel – Foto: Arquivo Pessoal/ND
‘Fugiu por não ter CNH’: o que disse o motorista que atropelou policial e matou homem em SC
O motorista suspeito de causar o atropelamento prestou depoimento à Polícia Civil na tarde da terça-feira (6), em Curitibanos, no Meio-Oeste de Santa Catarina.
“Ele alegou que transitava em velocidade normal. Disse que o local tinha baixa luminosidade e a policial e a outra vítima estavam abaixados, sem nenhum aviso luminoso”, revelou a delegada de Polícia Civil de Curitibanos, Grace Clos.
Segundo ela, o motorista, que é morador de Curitibanos, disse que dava uma volta na cidade após alguns compromissos no comércio. “Ele alegou que estava distraído e acabou batendo nas vítimas. Não é habilitado e por isso disse que fugiu”, detalhou.
À delegada, motorista que atropelou policial e matou homem disse que chegou a dar voltas pelo local para certificar que as vítimas estavam sendo socorridas, mas fugiu por não ser habilitado. O homem não foi preso, uma vez que, conforme Grace, não há elementos para uma prisão preventiva no momento.
Ele responderá por homicídio culposo, lesão corporal em acidente de trânsito, fuga de local de acidente e omissão de socorro. A pena varia conforme o julgamento do juiz.
Após o interrogatório do motorista que atropelou policial e matou homem, outras testemunhas serão ouvidas, bem como a policial militar, quando receber alta hospitalar.
A defesa do suspeito, por meio de nota, disse que o motorista se apresentou voluntariamente à delegacia para prestar esclarecimentos e colaborar com a apuração da verdade.
Destacou que não houve intenção dolosa e a via estava escura e sem sinalização adequada, assim como na viatura parada, o que, segundo a defesa, teria contribuído para o acidente. Já as luzes do carro estariam todas ligadas.
A defesa também desmente que o motorista tenha atropelado por duas vezes a vítima e que câmeras de segurança do local afastam essa informação. “É absolutamente mentiroso, até criminal tal alegação”.
O suspeito também diz que passou pelo teste de consumo de álcool e o resultado negativo foi apresentado às autoridades.
“O motorista, muito abalado emocionalmente, deixou o local do acidente por medo, após perceber que as vítimas já estavam sendo socorridas. Ainda assim, não se furtou a prestar todos os esclarecimentos, demonstrando desde o início disposição para colaborar com a verdade”, complementa a nota.