Pesquisa da UFSC pretende melhorar terapia de crianças autistas com Inteligência Artificial

Uma ferramenta em desenvolvimento pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) busca auxiliar e aumentar a efetividade do processo terapêutico de crianças autistas por meio do uso de Inteligência Artificial (IA). O projeto, conduzido pelo professor Jônata Tyska, do Departamento de Informática e Estatística, estuda o desenvolvimento e aplicação de técnicas de machine learning para a extração de padrões e eventos de interesse em sessões de terapia. Estas análises são consideradas essenciais para que o tratamento melhore o desenvolvimento cognitivo, de comunicação, e a qualidade de vida de crianças com autismo.

A proximidade com o assunto surgiu durante o doutorado do professor junto ao Instituto de Ciências e Tecnologias da Cognição (ISTC), em Roma, que é um instituto de pesquisa do Conselho Nacional de Pesquisas Italiano (CNR). Durante este período, embora o tema principal de seu doutorado fosse a robótica e a Inteligência Artificial, havia um grupo de pesquisadores desenvolvendo pesquisas sobre o autismo.

Um dos estudos realizados por essa equipe resultou em um dispositivo chamado Plus Me: Companheiros Vestíveis Transitórios. Em formato de um urso panda de pelúcia, o objeto é utilizado para a terapia de crianças. O dispositivo experimental, sensível ao toque, consegue reagir com luzes e sons às interações do paciente com o dispositivo, recurso potencialmente relevante para a prática terapêutica.

Tyska trouxe dispositivo desenvolvido para tratamento de crianças com autismo. Foto: reprodução/Agecom/UFSC

O instituto também informa, no site do dispositivo, que ele é capaz de emitir respostas atraentes como luzes coloridas e sons divertidos quando tocado nas patas. Os estímulos são chamados de resultados gratificantes, pois as crianças geralmente demonstram satisfação quando recebem esse tipo de feedback. O dispositivo está conectado a um tablet de controle que permite a um terapeuta, por exemplo, modificar parâmetros de acordo com a reação da criança.

Recentemente, o professor trouxe um desses dispositivos da Itália para poder utilizá-los em estudos futuros no Brasil. Um importante parceiro deste projeto no Brasil, e que será responsável pelas coletas de dados e testes com as aplicações e dispositivos desenvolvidos no projeto, é o Instituto Farol, um Centro de Excelência e Inovação em Autismo.

Atualmente, os dados utilizados para o desenvolvimento da ferramenta na UFSC são dados públicos de uso do dispositivo na Itália. Esse banco de dados é formado por vídeos de sessões terapêuticas gravadas pelos pesquisadores do ISTC. “Eles realizaram alguns experimentos na Itália e isso gerou esse grande volume de dados, que utilizamos para realizar nossa pesquisa no Brasil”, explica Tyska.

Com a participação de estudantes de Graduação, bolsistas de iniciação científica, e Pós-Graduação, o professor decidiu então usar esses dados para pensar em uma forma de facilitar a detecção e registro de eventos interessantes nas sessões de terapia. Assim como o diagnóstico, o processo terapêutico de crianças autistas é uma etapa muito importante para a melhoria de sua qualidade de vida.

Como funciona

Eventos são identificados com base na interação da criança. Fotos: reprodução/Agecom/UFSC

A proposta da ferramenta é trabalhar com a detecção automática dos eventos interessantes por meio da identificação das interações entre a criança e o terapeuta ou, eventualmente, um brinquedo, a exemplo do Plus Me.

A Inteligência Artificial, desta forma, cria o mecanismo capaz de perceber uma ação da criança que deva ser registrada na sessão terapêutica. Isso facilita um trabalho que não só demandava tempo, como podia fazer com que o terapeuta deixasse de prestar atenção nas interações para interromper o trabalho e fazer o registro.

Com a ferramenta, essa identificação automática dos eventos interessantes ocorreria a partir da gravação das sessões e do reconhecimento desses episódios por meio da IA. “O trabalho manual limita o atendimento. O acesso aos registros produzidos na Itália permitiu que treinássemos o sistema a partir desses vídeos públicos”, comenta o professor.

O pesquisador lembra que o protótipo desenvolvido na UFSC ainda é uma ferramenta de pesquisa, um esforço para construir algo que poderá ter um impacto positivo no tratamento de crianças autistas. “Pela falta de recursos de pesquisa considero que é ainda uma ação embrionária, mas ela está alinhada com um dos balizadores da minha carreira que é maximizar os impactos positivos da IA na vida das pessoas da forma mais direta possível. O projeto tem essa potencialidade de aumentar a capacidade dos profissionais atenderem a população de forma mais ampla, mantendo a qualidade do atendimento e sem sobrecarregá-los com tarefas que podem ser automatizadas usando Inteligência Artificial”, comenta.

Para isso, é necessário ter segurança de que as ferramentas funcionem. “Falamos em ampliar o acesso não pensando no produtivismo, mas justamente para melhorar a qualidade do que já é feito e ampliar o acesso às pessoas”, justifica. Hoje, os estudos também são acompanhados pelo Instituto Farol, que presta atendimento direto às crianças que possuem risco ou diagnóstico de autismo, e treinamento aos pais e profissionais que desejam aprofundar seus conhecimentos na área da intervenção precoce no autismo.

“O Instituto se mostrou muito aberto a avançar nas pesquisas de I.A aplicadas ao diagnóstico e às terapias de crianças com autismo”, comenta Tyska. Além das sessões de terapia, o professor e sua equipe estão investigando e desenvolvendo também ferramentas de diagnóstico, com o objetivo de rastrear o olhar das crianças a partir de navegadores da web. Esta linha conta com o protagonismo da Professora Simone Werner, especialista em Estatística e também professora do Departamento de Informática e Estatística da UFSC. A atuação da professora garante a segurança e a validade estatística dos resultados obtidos com a pesquisa.

Amanda Miranda | [email protected]
Agência de Comunicação | UFSC

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