Quem tem direito à anistia? Entenda os critérios legais e históricos

Quem tem direito à anistia? Manifestantes do 8/01 cobram aplicação da lei

Quem tem direito à anistia? Manifestantes do 8 de janeiro podem ser beneficiados pela lei.

Quem tem direito à anistia? Manifestantes quere este direito

Manifestantes ocupam rampa do Congresso Nacional, em Brasília. – Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

No Brasil, a palavra anistia costuma aparecer sempre em meio a debates políticos, econômicos e sociais. Seja no contexto de perdão de dívidas, de infrações ambientais ou de crimes políticos, o termo levanta sempre uma dúvida: quem tem direito à anistia?

Mas para ter direito ao perdão concedido pela anistia, prevista em lei no Brasil, o cidadão deve preencher alguns requisitos. Ou seja, o benefício não se aplica a qualquer situação, e nem ocorre de forma automática.

A anistia é um mecanismo previsto pela legislação brasileira, que permite ao Estado perdoar infrações já cometidas, suspendendo penas ou dívidas e em alguns casos encerrando processos. Porém, ao contrário do que se pode pensar, esse benefício não é automático nem ilimitado.

Ele só é aplicado quando existe uma lei específica que define claramente quem pode receber a anistia, qual o tipo de ato será perdoado e em que circunstâncias se dará o perdão.

O que é anistia e como ela funciona na lei brasileira

Do ponto de vista jurídico, a anistia, que tem todo um impacto histórico, é um ato legislativo que perdoa a prática de um crime, infração administrativa ou dívida, extinguindo as suas consequências legais. A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XLIII, prevê que cabe ao Congresso Nacional decidir sobre anistias — geralmente por meio de uma lei que especifica quais condutas e quais pessoas estão incluídas e podem receber o benefício.

A advogada criminalista Amanda Silva Santos explica que a anistia depende de lei ordinária, com efeitos retroativos, que encerram a punibilidade de um crime. “Essa modalidade, em regra, se destina a crimes políticos, abrangendo, excepcionalmente, crimes comuns”, completa.

Diferente do indulto, que é um perdão concedido de forma individual pelo Presidente da República, a anistia sempre tem caráter coletivo. Ou seja, ela se destina a grupos específicos, não a indivíduos isolados. Um caso clássico foi a anistia a exilados políticos concedida pelo Governo brasileiro em 1979.

Para ser aplicada, a anistia depende de alguns fatores, como a aprovação de lei específica pelo Congresso Nacional; a delimitação do período e tipo de ato ou infração a ser perdoada; e ainda a fixação de critérios claros sobre quem será beneficiado pela anistia.

Quem tem direito à anistia?

A resposta direta para esse questionamento é: quem estiver incluído na lei que concede a anistia. Não existe um direito prévio ou garantido. O direito surge somente a partir da promulgação da lei aprovada pelo Congresso Nacional, que precisa detalhar quais atos e quais grupos sociais, políticos ou econômicos serão contemplados.

O Brasil aplicou a anistia em diferentes contextos ao longo de sua história, e utilizou a lei para perdoar  perseguidos políticos, devedores fiscais, proprietários rurais e até manifestantes. Cada caso foi tratado por legislação específica que limitou quem teria ou não direito a anistia.

Quem tem direito à anistia?

Congresso Nacional vive deabte sobre: Quem tem direito à anistia? – Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil/ND

Quando a anistia foi concedida no Brasil?

O caso mais emblemático e conhecido da anistia é a política, concedida a partir da Lei 6.683/1979. A legislação foi sancionada pelo último presidente militar da República, João Figueiredo, e deu largada ao processo de reabertura politica no Brasil após longos anos de ditadura, instituída por um golpe militar na década de 60.

Essa lei concedeu perdão a crimes políticos cometidos até 15 de agosto de 1979, beneficiando exilados, presos e perseguidos políticos. Com o perdão dos crimes e a extinção de penas, muitos brasileiros retornaram ao Brasil e retomaram suas vidas e carreiras políticas.

Esta mesma lei, no entanto, garantiu perdão aos militares e agentes do Estado que cometeram crimes políticos, fato que foi contestado por militantes e ativistas políticos, e que levou a lei a ser alvo de questionamento no Supremo Tribunal Federal (STF). Porém a Corte Constitucional reafirmou a constitucionalidade da legislação.

Mas a anistia já tinha sido aplicada antes em território brasileiro. O instrumento foi utilizado por Dom Pedro I em 1822 para conferir perdão àqueles que detinham opiniões contrárias à independência do Brasil, antes dominado por Portugal.

Alguns anos depois, em 1875, Dom Pedro II, por meio do Decreto 5.993, anistiou religiosos envolvidos em conflitos entre o Império e a Igreja.

Em 1910,  após a abolição da escravatura, Hermes Fonseca, por intermédio do Decreto 2.280, também conferiu anistia aos militantes envolvidos na Revolta da Chibata, que ficou conhecida por ter sido uma reação dos marinheiros brasileiros aos castigos físicos a que eram submetidos. Ou seja, uma prova de que anistia no Brasil não é um assunto novo.

A advogada Amanda Silva Santos ressalta ainda que ao longo das sete Constituições do Brasil foram editadas diversas leis de anistias, “com intuito de beneficiar presos, militantes, militares, presos políticos após a redemocratização e, inclusive, reintegrar exilados. Ademais, foram conferidas anistias tributárias, perdoando dívidas de contribuintes com o fisco, visando estimular a regularização fiscal”, acrescenta.

Mais recentemente, o debate sobre a anistia tem se concentrado sobre a possibilidade de perdão aos envolvidos nas manifestações do 8 de janeiro de 2023, que culminaram com a invasão e depredacão de prédios públicos em Brasília.

Manifestantes protestam contra a PL. Mas Quem tem direito à anistia? – Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil

Para além do perdão político, a anistia também se estende ao campo tributário, e é aplicada com frequência para regularizar dívidas. O exemplo mais conhecido é o Programa de Recuperação Fiscal (REFIS), instituído pela Lei nº 9.964/2000. O programa permitiu que empresas e cidadãos renegociassem dívidas tributárias com descontos sobre multas e juros.

Esse tipo de anistia costuma ser justificado como uma forma de incentivar a arrecadação e aliviar crises econômicas, permitindo que contribuintes regularizem sua situação junto ao fisco.

Em outro caso mais recente na história brasileira, proprietários rurais que desmataram áreas de preservação permanente antes de 2008 foram anistiados durante o governo de Dilma Roussef, após a edição do novo Código Florestal. O objetivo, neste caso, foi facilitar a regularização ambiental e reduzir possíveis conflitos fundiários.

A anistia também pode ser administrativa, e foi aplicada para perdoar multas aplicadas a caminhoneiros autuados por infrações de trânsito durante a greve nacional da categoria, em 2018. O projeto foi aprovado pelo Congresso para “zerar”as multas de motoristas que pararam as estradas do país em protesto contra o baixo preço do frete e altos valores do diesel e tarifas de pedágios.

O papel do STF nas decisões sobre anistia

Plenário do STF discute quem tem direito à anistia? – Foto: Gustavo Moreno/STF/ND

O Supremo Tribunal Federal (STF) também desempenha papel importante na análise de leis que concedem anistia. Em 2010, ao ser questionado pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o STF julgou que a Lei da Anistia de 1979 continua válida, inclusive protegendo agentes do Estado que tinham sido acusados de tortura.

Além disso, o STF frequentemente analisa se projetos ou leis de anistia estão de acordo com a Constituição, especialmente quando tocam em temas sensíveis como direitos humanos ou interesses fiscais. Mas ainda é cedo para se responder plenamente a pergunta: Quem tem direito à anistia?

 

 

 

 

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